O cenário mundial
O turismo é uma indústria que resulta da maior disponibilidade de tempo e poder de compra das sociedades. Falar em perfil e comportamentos de cidadão-turista, só faz sentido em sociedades que atingiram um determinado padrão socioeconómico. Países de terceiro mundo, nada contribuem para os fluxos/emissão turística e mesmo no caso dos países em vias de desenvolvimento, é pouco significativa a sua contribuição. Esta afirmação, pode ser constatada nos dados estatísticos mundiais, quando comparados, fatores como – grau de desenvolvimento verus contributo dessas sociedades para os fluxos desta indústria.
Ao contrário do que é por muitos defendido, programar a estratégia de médio e longo prazo da oferta dos serviços que deverão vir a responder ao que será a tendência da procura desses mercados emissores, não é um exercício impossível e poderemos até afirmar que tal exercício, feito com a devida metodologia e prudência, representa um fator de profunda vantagem competitiva. A construção deste instrumento de diferenciação competitiva, é da exclusiva responsabilidade dos governos nacionais e regionais. Desenhar uma política para o turismo, coerente, clara e exequível é talvez o maior desafio e simultaneamente o maior fator de diferenciação positiva, na hora de atrair investimentos para o setor, dando garantias aos vários intervenientes na construção da competitividade do Cluster.
O investimento em turismo, é considerado tecnicamente um investimento em capital intensivo. Isto significa que em termos globais os grandes fluxos de investimento internacional que levam aos projetos estruturantes e mudam significativamente a realidade internacional, obrigam a que os países que pretendam atrair esses fluxos e investimentos, apresentam o conjunto de garantias para que sejam consumadas as decisões dos grandes investidores, operadores e consequentemente que arrastam consigo os mercados e tendências.
Uma estratégia nacional, coerente e sustentável, para além do potencial que esse país pode apresentar, necessita de organizar as suas instituições governativas e apresentar três garantias fundamentais, a saber:
- Plano estratégico a médio e longo prazo claro, coerente e organizado com os objetivos a levar a efeito, no plano Nacional/Regional;
- Políticas económicas, financeiras e fiscais alinhadas com o plano estratégico de médio e longo prazo;
- Quadro legislativo para o setor, claro, prático e coerente com os dois primeiros.
A aplicação efetiva, com um elevado grau de sucesso, depende, em muito, da forma como estão organizados e distribuídas as competências pelas várias instituições públicas responsáveis por implementar, monitorizar e fiscalizar, o setor. Recorde-se que muitos planos estratégicos criados, em vários países do mundo, com enorme know-how, dotados de uma boa política de incentivo fiscal e financeira, terminaram por falhar redondamente, na hora da sua aplicação no terreno. Então deveríamos definir um outro fator de enorme sensibilidade que se torna necessário ver cumprido num projeto destas características e dimensões.
O cenário Brasileiro
Após uma análise ao cenário interno, como forma de avaliar e detetar possíveis fragilidades no que toca ao enquadramento e futuro relacionamento institucional, para a garantia da persecução dos objetivos do projeto, concluísse que o panorama institucional em que se realiza a organização das instituições de serviço público, mandatadas para a organização, orientação e definição da indústria do turismo no Brasil, está estabelecido em dois grandes eixos;
- Nacional – Ministério do Turismo, no âmbito central/nacional,
- Estadual – Secretarias de Turismo, no âmbito regional/estadual.
Junto a estes dois órgãos, coabitam um conjunto de instituições que coordenadamente auxiliam nas políticas de ordenamento, constituição, planeamento, licenciamento, monitorização e fiscalização do setor. A complexidade do sistema Brasileiro, na perspetiva do investidor externo, pouco habituado a um emaranhado complexo de instituições em que se desdobram as competências governamentais (centrais e regionais), cria logo à partida um handicap no que representa a uniformização e facilitação de investimento, quando comparado com os mercados mais estruturados, no que à indústria de turismo se refere.
De salientar que a complexidade em que o país apresenta a forma de se organizar, é em parte, originada por dois fatores que são induzidos externamente e não se refletem por motivos de inoperância ou incompetência interna, a saber:
- Dimensão do território, por sua vez complexidade e multiplicidade dos potenciais envolvidos;
- Rápido crescimento devido à procura interna e externa.
Existe um terceiro fator, esse sim interno, mas que termina por se salientar mais devido à influência que os dois primeiros acabem para gerar, concretamente:
- A pouca experiência das instituições brasileiras – a forma como se organizam na atualidade, principalmente ao nível do estado central, no que deveria representar o papel central do ministério do turismo, enquanto órgão mais de agregação e coordenação das politicas estaduais, do que de construtor de soluções que depois de mostram deslocadas, descoordenadas e desajustadas às realidades dos vários Estados.
Note-se que a criação do ministério do turismo brasileiro (MTUR) data de 2003, até aí, já os vários estados, se mantinham organizados no que à política de turismo se referia, através dos seus sistemas estaduais, onde a figura antecessora das secretarias de turismo representavam um papel fundamental. São, na atualidade, estes organismos e os seus técnicos que melhor contribuem para a coerência e orientação estrutural do turismo nas suas regiões. Este sistema deveria ser mantido, cabendo ao poder central (MTUR) a função de orientação geral e coordenação global, no que à relação interna se refere. Cabendo também a liderança da promoção internacional do produto Brasil, esta é uma competência exercida na atualidade através da EMBRATUR.
No entanto, este fato, significa que no cômputo da estratégia interna nacional, naqueles que poderiam ser os objetivos macro do país no panorama continental e mesmo internacional, terminam por se apresentar de forma pouco eficiente. Não há uma estratégia bem alinhada e coordenada centralmente e não existe a capacidade instalada, ainda, de o ver alcançado, isto, dentro da análise aqui efetuada e expressa num parecer, tido no âmbito da visão externa que é o que importa ter aqui, como método de abordagem, na perspetiva do investimento externo.
Neste sentido, da análise efetuada, foram detetadas algumas fragilidades na forma e modo como o cluster do turismo está a ser gerido institucionalmente e que podem criar pontos de interferência negativa aquando do planeamento e execução do projeto. Assim manda a prudência técnica que se executem planos de contingência que tenham em conta as medidas necessárias a implementar como forma de intervir, caso se venha a constatar a sua permanência no período da realização dos projetos definitivos e da execução e da sua operacionalização efetiva, a saber:
- Não existe um planeamento estratégico a médio e longo prazo, nem nacional, nem estadual;
- Os planos organizadores para o turismo, que podem ser considerados como tal, quer de âmbito nacional, quer de âmbito estadual, são feitos a 2-4 anos e quase todos se encontram desatualizados;
- Não existe uma política de gestão clara do território no âmbito do turismo, organizada ao nível nacional, nem nos estados em análise, dentro dos grupos estudados. A que existe, contradiz-se quando comparado o planeamento central e estadual (por exemplo, verificados os planos diretores municipais);
- Não se encontram coordenados os instrumentos de incentivo financeiro e fiscal (Central e Estadual), com as intenções relativas ao que se entende por direção a seguir*.
Nota*: Surgem, quer ao nível central (Ministério do Turismo), quer ao nível estadual (secretarias de turismo), estudos técnicos excelentes que fazem uma perfeita leitura da realidade instalada, potenciais existentes e onde apontam linhas de orientação, no entanto, saliente-se que pese embora a qualidade e know-how aí apresentado, estes estudos, não são linhas estratégicas definidas politicamente e por isso, não tem força legal. Como tal, verifica-se um vazio, no que à estratégia efetiva para o cluster, se refere.
O mercado-alvo interno potencial – Caracterização
Desde cedo, com o desenvolvimento da sociedade industrial e do sistema financeiro moderno, surge o conceito de classes sociais. Esta forma de classificar as condições económicas e sociais dos cidadãos, passou a ser aceite e obrigou à constituição de um padrão normalizado. Assim com base no rendimento salarial e riqueza adquirida, as famílias, passaram a ser dívidas em três níveis diferentes, dentro dos quais, por vezes, se organizam ainda alguns subníveis. A estratificação económica das classes sociais, seguem uma classificação de – baixa, média e alta, sendo que as duas primeiras designam o estrato da população com menor capacidade financeira, a primeira a que vive mesmo com dificuldades económicas, e a última, a que possui grande margem financeira.
No entanto, com o desenvolvimento dos mercados e a sofisticação das economias, foi necessário incentivar o aumento do consumo. Sendo a classe média, o estrato considerado mais comum e mais numeroso nas sociedades industrializadas dos países de primeiro e segundo mundo, tal fato e para fazer funcionar os mercados, tiveram que se encontrar formas de aumentar a capacidade de consumo desta classe. Através de mecanismos de aumento do rendimento, de crédito ao consumo, etc., foram alcançados os objetivos de incluir a classe média mundial, nos hábitos de consumo dos mais abastados financeiramente. Isto consequentemente permitiu que os mercados aumentassem tremendamente o volume de transações, resultado da maior procura de bens e serviços de consumo, por parte de uma nova classe de novos consumidores – a plataforma da designada classe média moderna.
No caso do Brasil, é possível encontrar outras subclasses, mas deveremos agrega-las como forma de proceder à referida normalização internacional. A avaliação ideal deveria ser efetuada pelo índice de poder de compra e não pelo rendimento. No entanto, a classificação mais comum, no Brasil, utiliza o sistema de salários mínimos e será com base nessa referência e no que resulta dela, face ao que podemos entender por comportamento no índice de poder de compra, que trabalharemos.
- Até 1 Salário Mínimo
- De 1 a 2 Salários Mínimos
- De 2 a 3 Salários Mínimos
- De 3 a 5 Salários Mínimos
- De 5 a 10 Salários Mínimos
- De 10 a 20 Salários Mínimos
- Mais de 20 Salários Mínimos
Nota: Salario Minino R$ 678 (a partir de Janeiro de 2013)
Outra classificação:
- Classe A1: inclui as famílias com renda mensal maior que R$ 14.400
- Classe A2: maior que R$ 8.100
- Classe B1: maior que R$ 4.600
- Classe B2: maior que R$ 2.300
- Classe C1: maior que R$ 1.400
- Classe C2: maior que R$ 950
- Classe D: maior que R$ 600
- Classe E: maior que R$ 400
- Classe F: menor que R$ 200
Nas três últimas décadas o Brasil deixou de ter aquela distribuição económica e social que podia ser representada por uma pirâmide. Com uma larga base assente na classe social mais pobre, uma classe média reduzida e um cume menor ainda, relativo à classe alta.
Hoje, a classe C (classe média) é constituída por famílias que contam com um rendimento mensal entre três e dez salários mínimos. Atualmente, assistimos a uma nova representação gráfica, o losango, onde a base está mais estreita, pois a classe D engrossou a classe C (classe média), com consequências positivas para os hábitos de consumo. O cume, por sua vez, também se alargou ligeiramente, com novos-ricos que juntaram a elite.
Hoje, a classe C é constituída por famílias que contam com um rendimento mensal entre três e dez salários mínimos. Esse rendimento, para uma grande parte dessa população, foi alcançado nos últimos anos em decorrência de diversos fatores, entre eles, as políticas de eliminação da pobreza e inclusão social, assim como a logica inerente ao crescimento económico do Brasil.
Com o aumento do poder de compra e a utilização de várias formas de crédito, a nova classe média tem demonstrado um grande interesse em novas tecnologias, bens de consumo e itens cotidianos como são as ofertas de turismo, lazer e entretenimento. Assim, este grupo aumentou o consumo em geral, melhorando seu padrão de vida e movimentando o mercado interno de produtos industrializados, bem como o de comércio e serviços.
Estudos da Fundação Getúlio Vargas (FGV) preveem que o movimento de ascensão das classes D e E vai continuar por, pelo menos, mais oito anos – a Classe C, ou classe média, já representa 50,5% da população do país. Esse é um novo dado que deverá ser considerado pelos governos na adoção de políticas públicas. Além disso, é um fator extremamente relevante para o planeamento, o marketing e os estudos relacionados com as novas ofertas para a indústria de turismo.
A nova situação da maioria da população brasileira, ou seja, de 95 milhões de brasileiros que se localizam na classe média, faz com que existam perspetivas de crescimento sustentável para o Brasil, quando comprado internacionalmente com a situação económica de outras populações mundiais e suas classes médias.
Somente nos últimos 10 anos, 31 milhões de brasileiros passaram a fazer parte da classe média, com aumento da escolaridade e poder de compra de consumidores. Além do grande número de novos postos de trabalho, no mercado formal e informal, as mulheres também passaram a trabalhar, alterando a situação de rendimento das famílias. Mais opções de consumo passaram a fazer parte do cabaz de compras cotidiano dos brasileiros.
Segundo a OMT, no que toca ao aumento de consumo do turista Brasileiro para o exterior, importa aqui anotar que este fluxo aumentou, em valor absoluto, no último ano (dados preliminares de 2011), em 32% (valor de despesa efetuada). Assim o valor absoluto gasto pelo turista Brasileiro ficou a par com outros dois países emergentes (Rússia e India) que juntos representam os maiores aumentos deste item no panorama mundial. Tendo sido, na sua maioria a despesa efetuado no continente e para destinos Europeus.
In: Extrato de texto no âmbito do estudo preliminar de localização para mega projeto de animação turística – América do Sul (Antero Carvalho).